terça-feira, 16 de novembro de 2010

Marina & Leonid, crónica no i


Na praça do Rossio, ela segura uma câmara fotográfica e pergunta-me: “Do you speak English?” E depois de apertar o botão fico a saber que se chama Marina, que o marido, Leonid, fugiu da Letónia, então URSS, durante a Segunda Guerra Mundial, escondendo o seu sangue judeu no Uzbequistão. Regressou no final da guerra e casou com Marina, também judia – “Ele teve de identificar os irmãos mortos durante a ocupação alemã”. Mais tarde, Leonid serviu no exército soviético junto da fronteira com a China, a mais de nove mil quilómetros de casa: “Era muito duro, demorámos um mês para lá chegar”. Em 1977 Marina e Leonid tinham um filho: “Por causa dele fugimos para Berlim Ocidental. Queríamos que tivesse uma vida melhor”. Marina e Leonid saíram de um país que os tinha sob controlo para um país que, quatro décadas antes, os invadira. Falam de Berlim como a sua casa: “Já voltei à Letónia, mas é diferente, há gente muito rica ou muito pobre, não há nada no meio. Tens de vir a Berlim.” Marina fala um inglês eloquente – “Fiz um curso de línguas” – e os seus olhos agigantam-se ao mencionar o filho: “Estudou hotelaria na Suíça, foi para os Estados Unidos, casou-se com uma israelita e tenho dois netos.” Fala-me da importância da família. Tem tantas saudades do filho. Percebe-se tão bem quando me abraça e se despede e lhe digo: “Goodbye”. Ela responde: “Never say goodbye”. Já em casa descubro que os nazis mataram 90 mil lituanos entre 1941 e 1944. Tanto tempo depois Marina e Leonid estão na praça que cruzo todos os dias. Marina tinha razão: “Never say goodbye”.

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